Cerrado será figurante na Rio+20


Rosane Garcia

O cerrado, segundo maior bioma brasileiro, não será tema de expressão na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio +20), que ocorrerá em junho próximo. A sua abordagem se dará como questão transversal à pauta de discussão. E não é por falta de relevância, pois o bioma ocupa 24% do território nacional, é reconhecido como berço as águas — responsável por 70% da vazão das bacias do Araguaia/Tocantins, São Francisco e Paraná/Paraguai — e detentor de 5% de toda a biodiversidade mundial.

E aí vai a primeira incoerência quando segurança alimentar e água figuram no rol dos principais itens da pauta de debates, ao lado de mudanças climáticas, combate à desertificação, economia verde e erradicação da pobreza. Sem água não dá para produzir alimentos, nem mesmo para sobreviver, o que compromete em boa parte o tema do encontro.
"De fato, o Brasil chegará com muito pouco sobre o cerrado na Rio+20, diz o presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado, senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). Para ele, o cerrado não conseguiu inspirar um amplo movimento nacional, como ocorre com a Amazônia e a Mata Atlântica, capazes de mobilizar os mais diferentes setores da sociedade em sua defesa. Hoje, restam 52% de vegetação nativa, conforme dados de 2008 do Projeto de Monitoramento do Desmatamento dos Biomas Brasileiros por Satélite. Para o senador, contribui para esse descaso com o cerrado o fato de a banca do Centro-Oeste no Congresso ser muito pequena e boa parte dela estar ligada ao agronegócio, que vê o cerrado como área natural de expansão da atividade agrícola.

Na Rio +20, o cerrado vai apenas compor uma mostra de todos os biomas brasileiros que está sendo organizada pelo Ministério do Meio Ambiente. O senador Rollemberg lamenta que não haja um espaço de destaque para a savana brasileira. E cita o pesquisador Eduardo Delgado Assad, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), para quem o cerrado é o maior laboratório de gene do mundo. A capacidade de adaptação das espécies à variação climática (chuva, seca e frio intensos) precisava mais bem estudada. A identificação desse gene permitiria a sua aplicação na agricultura, o que ampliaria exponencialmente a produção de alimentos, sem necessidade, como muitos pretendem, de expansão da área plantada.

Mas todas essas virtudes nem sequer conferiram ao cerrado o status de patrimônio nacional, a exemplo do que ocorreu com a Amazônia, a Mata Atlântica , o Pantanal mato-grossense, a Serra do Mar e a Zona Costeira. Há 17 anos tramita na Câmara dos Deputados a PEC 115/95, de autoria do deputado goiano Pedro Wilson, que guinda o cerrado e a caatinga à condição de patrimônio nacional. Mais recentemente, o Senado aprovou a PEC 540/2010, de autoria do senador Demóstenes Torres que inclui os dois biomas entre os bens considerados patrimônio nacional. As duas propostas adormecem na Câmara.

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